Esse processo de imigração não foi nada fácil, muitas vezes
esse povo era enganado por aqueles agentes de emigração e pagavam suas viagens
para os Estados Unidos e desembarcavam no porto de Santos, isso era comum de acontecer, assim como mortes a bordo dos navios, visto que a viagem demorava
em média 24 dias e em condições precárias, assim como sua vida no Brasil
também acabaria sendo. Esta carta de um desses imigrantes relata como foi sua viagem e o começo de sua vida no Brasil ao seu antigo
patrão na Itália:
Aqui temos o texto traduzido por Silvia Scotoni Levy, onde é possível ter uma noção minima referente ao modo como eram tratados esses imigrantes:
“Distinto senhor Dr.
Ferdinando Chisini Pieve di Soligo
Depois de um longo
silêncio, ora envio ao senhor minhas noticias.
Com grande dor, devo
informá-lo da minha terrível sorte. Começarei por dizer-lhe alguma coisa da
viagem que foi tão sofrida, que por meu conselho, nem mesmo o meu cachorro, que
deixei na Itália, deveria enfrentar tais tribulações. A dita viagem foi extremamente
pesada, primeiro Porter enfrentado quatro dias de grandes tempestades, depois,
por estarmos numa multidão no navio , e para terminar, tivemos um calor
infernal, Finalmente, depois de vinte e seis dias, desembarcamos em Santos.
Onde esperávamos dar ao nosso espírito um pouco de alento. Esperávamos ouvir
alguma boa noticia, mas quando dirigíamos algumas palavras a algum italiano a
resposta não era boa. A cada resposta negativa,crescia o nosso desespero.
Imediatamente, fomos embarcados num trem especial que, em 4horas, nos levou à
Casa da Imigração, em São Paulo. Lá chegando, nosso desespero ficou ainda maior
ao ver uma multidão de pessoas e saber que existia uma grande mortandade de
crianças. Quando ao calar da noite, observando toda a família e as minhas
pequenas crianças dormindo amontoadas sobre o chão, rodeadas por dez mil
pessoas, eu não consigo me dar paz.
De um lado do quarto,
chorava uma mulher, do outro, um homem. Observando as crianças e sentindo-me
culpado por tê-las feito passar por tantas provações, digo-lhe Sr. Patrão, que
não consegui parar de chorar toda a noite e assim passamos nosso primeiro dia
de repouso na América.
Finalmente, depois de
quatro dias, fomos levados de São Paulo a Santa Tereza, o nosso destino. Lá
chegando, vimos que nossa habitação ainda não estava preparada e então tivemos
que dormir. 139 pessoas, em uma pequena casa. Vendo os italianos que moravam
nessa fazenda havia cinco meses e observando os seus filhos pequenos com pés e
pernas completamente tomados por feridas provocadas por mordidas de insetos, o
que não lhes permitia nem sequer ficar de pé, digo a verdade ao Senhor que, ao
ver aquela imagem me pus a chorar e fugi dos meus filhos. Eu não teria tido
coragem d me reaproximar deles, se meu pai não tivesse vindo me buscar e me
conduzido de novo junto deles.
Chorando, descrevo ao
Senhor que, depois de poucos dias, todos os meus filhos e as mulheres adoeceram
e nós, que trouxemos onze filhos, agora ficamos apenas com cinco; os outros,
nós perdemos. Deixo ao Senhor para considerar o grau de nosso desespero e lhe
digo que, se tivesse tido o poder, não teria parado na América nem mesmo uma
hora. Espero que o bom Deus me empreste vida a mais, para que o mais breve
possível eu posa conduzir o resto de meus filhos para a Itália. Por meus
conselhos, não partirá nenhuma pessoa daí para vir à América, porque eu teria a
morte antes de partir.
As coisas seriam muito
boas se os sacerdotes fossem doutores e se encontrássemos tudo o que
necessitamos, como encontramos na Itália, porque, aqui aquele que trabalha com
vontade e goza de boa saúde ganha muito dinheiro. Porém, se adoece quinze dias,
gasta todas as economias com os remédios e outras coisas. Uma visita do doutor
custa trinta florins.
Por ora termino, mas
não sem antes pedir ao Senhor e a todos os seus que rezem por minha família,
para que Deus nos conserve a saúde e possamos nos rever em breve na Itália.
Perdoe-me de tal
incômodo, mas faça-me o favor d entregar esta carta ao seu destino, na primeira
oportunidade. Se for do seu agrado dar-me resposta desejo ter notícias suas.
Agora receba de minha
parte e de toda minha família as mais cordiais saudações e, ao mesmo tempo, me
faça o favor de saudar toda a sua família.
Adeus”
O seu desventurado
servo
Rosolen Bortolo
O meu endereço é América-Brasil
Província de São Paulo
- Estação Cordeiro - Santa Tereza
Referência:
Júnior, José Eduardo Heflinger. E os Italianos Chegaram. Unigráfica, 2010. Vol. 4
Franzina, Emilio. Merica! Merica! Emigrazione e colonizzazione nelle lettere dei contadini veneti e friulani in America latina (1876-1902). Cierre Edizioni, 1994
Que relato triste. Já havia ouvido histórias, mas ainda não tinha lido o relato escrito pelo próprio emigrante... É triste pensar que meus trisavós e suas crianças passaram por isso. Infelizmente, não os conheci. Vieram em 1897.
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